terça-feira, junho 12

Idas e Vindas


Tenho vergonha. Vergonha da minha instabilidade amorosa. Minha dúvida, no entanto, não se apresenta por ser preciso escolher um entre vários. Mas porque preciso aprender a aceitar os vários que tenho em um. Exigente como sou, não me detive em prolongar os minutos de minha oração ao elaborar, durante o período fervoroso que passei na igreja no decorrer da adolescência, uma lista de características básicas que um homem deveria ter para ser denominado namorado. A lista, então, foi criada. Por outro lado, acreditar que uma única pessoa seria repleta de todas aquelas características – a meu ver, qualidades - seria audácia demais de minha parte. E aquele que alcançou este posto em minha vida há mais de um ano, surpreendentemente, completou todos os requisitos. Os requisitos necessários e outros que vieram juntos como brindes. Nesse caso, porém, os brindes não se traduziram tais como aqueles presentes que a gente ganha como plus ao comprar um produto que está em promoção. Eles acompanharam todo aquele conjunto maravilhoso de namorado que sempre imaginei, mas sua função era um tanto quanto desafiadora: saber se o que havia entre nós era amor ou paixão.

Como eu desejava, ele é inteligente. 

Gosta de discutir sobre cinema e também sobre tecnologia. Porém adora efeitos especiais e é fã de iOS, enquanto eu me impressiono com um enredo bem elaborado e aprecio o Android.


Ele é, como eu sempre quis, engraçado.
Seja onde ou com quem estiver - conversando com um coronel do Exército no sul do país ou sendo atendido por um vendedor do Mercado Público no nordeste - ele é sempre capaz de elaborar uma piada apropriada. Porém não perde a oportunidade de me provocar uma cara de desgosto, ao soltar um de seus comentários inconvenientes (que ele considera extremamente divertidos), quando, na verdade, o que eu mais desejava era um beijo, acompanhado de um toque e de um sussurro no ouvido, que me fizessem sentir a mulher mais desejada naquele momento.


Ele sabe, como considerei importante desde a infância, dançar.
Em qualquer festa, passa a ser o centro das atenções ao exibir inúmeros passos e técnicas. Eu, por outro lado, sempre apreciei o estilo contemporâneo. Gosto de uma dança simples e bastante envolvente.


Ele ama, assim como eu, falar e falar.
Faça chuva, faça sol, o diálogo permanece. Conversamos durante horas e o assunto nunca esgota. Falamos sobre fatos do dia a dia, fazemos as vezes de psicólogos ao avaliar personalidades, discutimos sobre como podemos ajudar um conhecido que vive um período conturbado, decidimos a que evento iremos naquela sexta-feira em que todos os amigos decidiram marcar festas em locais diferentes, e em horários idênticos. Enfim, temas não nos faltam. O que nos falta, na verdade, é tempo. Sem que percebamos, já são cinco horas da manhã de domingo e precisamos acordar cedo no outro dia. Resta-nos uma cara de zumbi durante toda a segunda-feira.


O atributo de companheirismo, como solicitado em minha oração, ele tem.
Desde sempre, deu-se bem com todos os meus amigos. Tão bem, ao ponto de também ser considerado, por eles, um amigo. No entanto, quando chega o final de semana e tomo algumas biritas, ligo para meus fiéis aliados, digo a eles que meu namorado está me batendo e que não me deixa sair de casa. Eles interpretam que, no máximo, caí um tombo quando o namorado me jogou na água fria do chuveiro e que não pensou duas vezes antes de me conter, porque eu, provavelmente, queria andar nua na rua. Depois que passa o efeito do álcool, eu percebo: eles estavam certos.


Um dos valores básicos de um bom caráter, ele tem: a humildade.
Conversa, com respeito, com empresários e empregados. Sabe apreciar um encontro em um parque e também em um bom restaurante. Contudo não viaja, caso não consiga ótimo hotel; não dorme, se não estiver de banho tomado; não se sente bem, desde que o ar condicionado esteja ligado.


Fiel ele também é.
Não deitou-se com outra mulher, nem ao menos lhe entregou um de seus beijos. Mas foi capaz de oferecer-lhes chocolates, massagens e outras vantagens e de negar, quando observei olhares de sedução, que alguma intenção havia entre os dois. Não demorou meses, nem mesmo semanas, para que, bisbilhotando suas conversas online, descobrisse que minhas desconfianças eram reais. 


A experiência de ser universitário, que sempre achei ser importante, ele conhece.
Já passou pelas graduações de engenharia da computação, física e dança. Ao todo, já deve estar há quase 10 anos no meio acadêmico. Por outro lado, a toga de formatura ele nunca usou.


Esses e outros contrastes e semelhanças são os responsáveis pela instabilidade e pela intensidade deste relacionamento. Já geraram inúmeras discussões e inúmeras conquistas. Lágrimas e sorrisos. Términos e voltas.
Diferente do que ocorre na paixão, o amor nos apresenta alguns desses conflitos, mas traz também, junto de si, a capacidade de superação.
Alguns dos elementos básicos de nossas personalidades - a capacidade de resolução de problemas dele e a paixão por aventura minha- acabam por limpar nossas mágoas e renovar os pilares de nosso sentimento. O respeito, a confiança e a admiração, embora tenham sido distorcidos ao longo deste período, permanecem como os pontos fortes.
Meus amigos, por cordialidade, ainda perguntam como estou quando observam a alteração de status de nossos perfis no facebook, mas sei que nenhum deles acredita mais em nossas brigas. Desde pequenos, todos fomos ensinados a realizar escolhas e a não expormos nossas inconstâncias quando elas ocorrem. Afinal, isto é ser adulto. Mas nós dois, mesmo que com idades de adultos, sabemos que seremos eternas crianças e, em razão disso, não hesitamos em expor nossos defeitos e limitações. Por mais paradoxo que pareça, é em razão desta transparência que amadurecemos.
Talvez, no fundo, não gostemos mesmo de um relacionamento estável. E, por isso, nos fechamos tão bem. Embora inúmeros casais não consigam suportar as eternas horas que usamos para discutir, chorar e, inclusive, sofrer; eles também nunca souberam o que é sair sem rumo na estrada e fazer, de um dia comum, um dia a ser lembrado em todos os outros. E destas experiências eu e ele temos várias para contar.

Bem-vindos!

Minha foto
Um conjunto de antíteses e uma mente apaixonada, que pulsam juntos em forma de sonhos. Graduanda em Psicologia e ex-estudante de Jornalismo na UFRGS.

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